ENCARCERAMENTO FEMININO, PRISÃO DOMICILIAR E (DES)IGUALDADE JURÍDICA: POTENCIALIDADES E INCERTEZAS DA MATERNIDADE NO CONTEXTO PRISIONAL

Autores

  • Bianca Garcia Neri
  • Jaqueline Vasconcellos de Miranda Carvalho

Palavras-chave:

Português

Resumo

De acordo com os últimos dados publicados em relatórios oficiais, é possível perceber que o encarceramento feminino no Brasil vem apresentando vertiginosa ascensão, com grande destaque para o número de prisões provisórias e a incidência do delito de tráfico de drogas. A falta de políticas públicas que considerem a prisão sob a perspectiva de gênero, face à inadequação estrutural e sensibilidade às necessidades femininas, torna os efeitos do cárcere ainda piores, notadamente no caso de mulheres que são mães ou gestantes. Visando efetivar as chamadas Regras de Bangkok, em 2016, foi publicada a Lei n. 13.257, que altera o Código de Processo Penal, determinando que o juiz “poderá” substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando se tratar de gestante ou mulher com filho até 12 anos incompletos. Diante da discricionariedade judicial admitida pela lei, diversos pedidos foram negados pelos tribunais pátrios, até mesmo sob argumentos de cunho moralista, considerando determinadas mulheres inaptas ao exercício da maternidade. O presente trabalho visa analisar o tom do discurso na jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, a partir de acórdãos que concederam ou negaram a prisão domiciliar a mulheres acusadas pela prática de tráfico de drogas, a fim de verificar (I) se a norma está sendo aplicada de maneira igualitária e (II) se as decisões que negam o direito reproduzem aspectos moralistas, em especial com marcas de uma cultura machista e patriarcal.

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Publicado

2023-12-15

Como Citar

Neri, B. G., & Vasconcellos de Miranda Carvalho, J. . (2023). ENCARCERAMENTO FEMININO, PRISÃO DOMICILIAR E (DES)IGUALDADE JURÍDICA: POTENCIALIDADES E INCERTEZAS DA MATERNIDADE NO CONTEXTO PRISIONAL. Revista Paradigma, 32(2), 209–232. Recuperado de https://revistas.unaerp.br/paradigma/article/view/2052